Alerta: o que pode estar presente na água e que você não vê

Medicamentos, hormônios sintéticos, metais pesados como chumbo, cádmio, alumínio são alguns dos componentes nocivos à saúde

Agentes tóxicos e poluentes, além de produtos que você nem poderia imaginar que estariam presentes na água que chega nas torneiras da sua casa podem ser um grande perigo para a saúde. Os resíduos são provenientes das mais diversas origens, desde esgotos domésticos e industriais, de atividades agropecuárias, entre outros. Esses componentes atravessam as estações de tratamento, que podem estar adotando processos pouco eficientes ou obsoletos. É o que alerta a engenheira química e professora titular do campus Curitibanos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Sonia Corina Hess. Ela é Autora de pareceres técnicos para órgãos públicos emitidos para diversos estados e vai lançar um livro pela Editora Expressão Popular, que reúne ensaios sobre poluição e doenças no Brasil.

De acordo com a pesquisadora, em todo o país, são coletados apenas 57% dos esgotos gerados, e tratados apenas 45% desse total. Devido a isso, a cada verão as praias ficam impróprias para banho, especialmente em Florianópolis, devido ao aumento do número de turistas e, consequentemente, na geração de esgoto. A docente destaca que as águas que passam pelas estações de tratamento para o abastecimento, em geral, ficam livres de microorganismos patogênicos, mas ainda contêm resíduos de substâncias químicas potencialmente perigosas e que nem todo esgoto coletado é tratado. Em São Paulo, por exemplo, dados oficiais mostram coleta de 87% e tratamento de apenas 62%, o que significa um déficit de 25% nesse processo.

Na bacia do rio Atibaia, que abastece a população de Campinas (SP), pesquisadores identificaram a presença de medicamentos e alguns tipos de hormônios sintéticos, como estradiol e progesterona, além de substâncias usadas na indústria plástica, como o bisfenol A e o dibutilftalato. Os hormônios artificiais encontrados pelos pesquisadores, que os químicos chamam de interferentes endócrinos, imitam a ação de hormônios femininos naturais e confundem o organismo, causando distúrbios em animais e seres humanos. Em mulheres, aumentam as chances de endometriose, câncer de mama e de útero. Em homens, crescimento das mamas, redução da libido, impotência e queda na contagem de espermatozoides.

Quanto ao bisfenol A, usado na indústria plástica, há associação comprovada de aumento de células de diversos tipos de câncer, como de mama, próstata e pâncreas, além de alterações endocrinológicas. Já o dibutilftalato, da classe dos ftalatos, usado na produção de PVC, entre outros materiais, guarda correlação com alterações endocrinológicas que, entre outras coisas, causam resistência à ação da insulina no organismo, além de obesidade.

Em 2015, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo encomendou à especialista catarinense um parecer sobre a qualidade da água tratada que abastece o município de Santo André. No relatório, ficou comprovada a presença de metais pesados como cádmio, chumbo, urânio e alumínio, o agrotóxico glifosato e seus derivados, e compostos orgânicos chamados trihalometanos. Ou seja, agentes tóxicos que passaram pelos processos de tratamento da água. O chumbo está associado à elevação da pressão arterial, comprometimento da função cardíaca, dores abdominais, alterações endocrinológicas e no sistema reprodutor, anemia, hipotireoidismo, transtornos mentais e doenças renais, entre outras.

De acordo com a pesquisadora, a Portaria 2.914 do Ministério da Saúde, exclui de sua lista de produtos tóxicos materiais poluentes como o alumínio, cujos sais são usados como coagulantes no processo de purificação nas estações de tratamento, que permanecem na água. Ao ser ingerido pelo homem, se acumulam nos ossos, rins e cérebro. Para Sonia Hess, há evidências que a substância cause problemas renais, anemia e alterações neuro-comportamentais em humanos após a exposição a doses excessivas. Estudos têm cada vez mais associado a crescente incidência de mal de Alzheimer e de Parkinson ao consumo de água de abastecimento.

Outra classe de agentes tóxicos muito provavelmente presentes na água distribuída à população é a dos trihalometanos (THMs), que podem resultar da reação química entre o cloro usado para evitar a proliferação de microorganismos e a matéria orgânica presente como poluente, caso dos agrotóxicos, por exemplo. Estudos realizados nos Estados Unidos associaram a presença dos THMs na água de abastecimento ao desencadeamento de câncer na população.

A pesquisadora catarinense defende também a revisão dos limites para nitratos e nitritos, cuja ingestão pode causar sérios danos à saúde humana. Portaria do Ministério da Saúde estabelece limite de 10 mg/L de águas de abastecimento. Pesquisas mostram que os nitritos e nitratos, usados como conservantes e antibacterianos, podem se transformar em nitrosaminas, substâncias causadoras de câncer de estômago, entre outros graves problemas de saúde.

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